quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Desventuras de Tardes Tediosas - Parte VIII

Sarah havia se acostumado a ouvir que era gorda. Sabia que amava comer e que devia fazê-lo menos, mas nem por isso seguia seus próprios conselhos. Portanto, diariamente suportava as ofensas de seus colegas de escola, e dos transeuntes intrometidos com os quais esbarrava, e dos professores da academia, e de seus primos, tios e avós. Havia se acostumado, mas isso não quer dizer que havia deixado de se ferir. Se um cachorro apanha todo dia, cedo ou tarde aquilo se tornará rotineiro, mas não fará a chinelada doer menos.

Portanto, quando ouviu daqueles dois estranhos que, incrível e infelizmente, eram as únicas pessoas que ela “conhecia” naquele lugar ela percebeu que machucou, e machucou da mesma maneira que machucava quando sua mãe falava-a para pegar uma colher a menos de feijão ou algo assim.

E não entendeu porque, e nem em qual momento, alguma coisa que os dois palermas diziam importava. E não saber isso deixou-a furiosa consigo mesma, e com aquele mundo estúpido e fétido ao seu redor. E aquela raiva a deixou com fome, muita fome. E pensou novamente no fato de a terem chamado de gorda, mas aquilo, naquele momento, não a chateou. A fez querer comer ainda mais, de raiva e birra. Sendo assim, quando voltou a encarar os dois rapazes ainda desnorteados, as lágrimas estavam secas e as sobrancelhas contraídas. Dimitri e Hani se entreolharam, perdidos, e Sarah abriu um sorriso maldoso que apenas ela entendeu.

-E ainda estamos aqui porque mesmo? – perguntou, deixando o par diante de si estupefatos. E aquelas expressões a fizeram rir baixinho, um riso só seu.

-Você é estranha, garota. – disse Hani, balançando a cabeça.

-E não pense que você é lá muito normal, garoto – Hani se assustou com a reação, deixando as pupilas se dilatarem antes que percebesse.

-Epa, epa, vamos parando por aqui – falou Dimitri, tocando o ombro do amigo que parecia estar começando a formar a palavra “garoto” na sua mente, e aquilo não lhe agradou. –Vamos antes que chova novamente e ela se irrite ainda mais – e, dizendo isso, o mais velho empurrou o embasbacado para trás, olhando para Sarah, que sorria internamente e triunfante.

Dimitri e ela se olharam, e ele abriu um sorriso debochado, quase uma risada. E ela também teria rido, se aquilo não fosse dar a mão a palmatória.

Os três caminharam na direção de uma casa-carroça localizada exatamente no meio da distância entre duas aberturas na parede. No caminho, garotas acenaram para eles e crianças correram entre suas pernas. Todos olhavam curiosos para Sarah, que tinha certeza de sua aparência deprimente. A calça molhada e pesada escorregava pela cadeira, e a camiseta larga estava grudada, moldando seus seios sem atrativos e a cintura que, na sua opinião, era deformada. As mulheres e senhoritas juntavam as cabeças para cochichar, os homens encaravam-a sem nenhuma vergonha. As crianças caminhavam ao seu lado, cutucando suas pernas e puxando suas roupas.

Havia um grito entalado em sua garganta, um grito de formas e cores únicas, mas que ela tratava de manter escondido. Espiava seus observadores com a mesma falta de pudor destes, e ninguém parecia se ofender. Quando Dimitri e Hani pararam, ela quase trombou com eles, parando a um dedo de distância das costas do mais novo. Quando encarou a roupa velha, recuou dois passos, visualizando melhor a casa na porta da qual Dimitri estava batendo.

A porta, as janelas e as rodas eram pintadas de um vermelho vivo e sedutor, simpático o suficiente para atrair a atenção certa. O teto era azul escuro, e as paredes da cor da própria madeira. Também azul escuro havia uma espécie de toldo que cobria toda a entrada, protegendo-a da chuva.

Dimitri bateu duas vezes na porta vermelha, e ela notou que a tinta estava começando a descascar. O som de alguém se movendo lá dentro, e a impressão de que o espaço era pequeno, soou até quatro passos atrás de Sarah.

-Só um minuto! – gritou a voz feminina lá dentro.

Em pouco estantes a porta se abriu, fazendo o queixo de Sarah ameaçar despencar. Em pé na porta estava uma mulher que pareci ter saído de um livro de contos. Os cabelos pretos eram densos e longos, presos em um rabo de cavalo puxado para frente. O vestido de camiseta branca e saia vermelha tinha um decote avantajado (ou seriam os seios da sra. Diamantina que eram grandes demais para suas roupas?). Era portava pulseiras, brincos de argolas, moedas costuradas na saia, tornozeleiras, todos de ouro. Era espalhafatosa e um pouco grande demais, os olhos escuros eram densos e profundos e fitaram Sarah com peso. Aquele olhar fez a menina se encolher, e a sobrancelha da mulher se erguer.

-Boa tarde, Diamantina – disse Dimitri, atraindo a atenção da dona da casa, que abriu um largo sorriso nos lábios rubros ao vê-lo.

-Dimitri, menino! – disse, quase gritando, enquanto abria os braços e o abraçava calorosamente.

Dimitri se tornou excessivamente diminuto ao lado de Diamantina e de seus seios, e aquilo gerava ondas de riso na barriga de Sarah que estavam se tornando difíceis de segurar.

-Finalmente veio me ver? Eu duvido! Aposto que tem alguma razão por trás dessa visita! Alguma coisa do seu pai, não é? – ela a encarou, e ele não conseguiu negar. –Háh, eu sabia! Cois do seu pai, é claro, Hani esta aqui e você esta com uma branca magricela! – os olhos da mulher de pele queimada de sol fitaram Sarah, que se surpreendeu com a alcunha e “magricela”, ignorando deliberadamente o “branca”.

exatamente sobre ela que eu queria falar – começou o filho do líder, desvencilhando-se cuidadosamente do abraço da mulher dez anos mais velha. –Ela é uma estrangeira, e precisa de comida, casa e roupa. Meu pai achou que você seria a pessoa perfeita para garantir isso.

-Perfeita, é? –ela abaixou os olhos para encarar o rapaz, e aquele olhar se demorou com um ar de seriedade desconhecida. Um ruído surgiu no fundo da garganta de Diamantina, que balançou a cabeça, irritada. –Eu sabia que um dia iam usar isso contra mim... Mas não pensei que mandariam por você, canário! Não sabia mesmo... Agora entrem logo antes que ela congele aqui fora!

Com um passo para o lado ela abriu o caminho para que os três entrassem. Hani foi o primeiro a fazê-lo e Dimitri fez questão de ser o segundo. Sarah os seguiu o mais rápido que pôde, sentindo o olhar que Diamantina lançou-lhe, observando seu corpo da cabeça aos pés e balançando a cabeça, como se aquela visão a deixasse decepcionada.

A porta se fechou barulhenta atrás dela, mas não foi o barulho que fez o susto se espalhar pelo corpo de Sarah. Foi a visão da casa de Diamantina que a jogou para dentro de uma história infatil que a fez ficar, vejam só, sem palavras.



-Ouvia os passos e as respirações que o seguiam, sentia os cheiros incomuns e desconhecidos, mas familiares, que estavam por todas as partes. As mentes roçavam a sua como gatos curiosos que se aproximavam sorrateiramente, ele ouvia as palavras que tentavam lhe escapar como hamsters dentro de uma gaiola. Mesmo que a multidão o houvesse engolido, havia um espaço grande demais entre ele e as pessoas mais próximas. Por trás das lentes escuras, observava aqueles que haviam tido a coragem de se aproximar, e via os olhares curiosos, os sorrisos interessados, as palavras sussurradas.







-Meu Nome não é Níh;

4 comentários:

Diego disse...

Baralho! Mais!! Mais!! Mais!! *O*

tatii lacorte disse...

te odeio. AHAHAHAHAHAH, escreva mais, gata (:

Juliana Akemi disse...

Amei amei amei.... quero logo a continuação... já me envolvi com a história..


parabéns!!!
bjss

Darlan (Filé) Júnior disse...

Olá Senhorita Nínive, você mantém um belo esáço poético aqui, parabéns! ^^

Eu sou um mísero integrante da Troupe Parabolandos.
Ficamos lisongeados com a sua visita ao nosso blog, e sim, pretendemos ir até o interior paulista pra apresentar sim, mas não temos data ainda!

Vamos mantendo contato.
Um beijo grande! até mais!

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